10 de jan. de 2011

honestamente

Quando acordar envolve mais do que abrir os olhos, você sente que se aproxima de uma curva numa estrada desconhecida - sem saber o que virá a seguir, mas com uma certeza incomum quanto ao que foi deixado para trás. Acordo com as costas leves, com a visão clara, com a mente apta a assimilar todo e qualquer estimulo enviado. Mas, do mesmo jeito como normalmente evita-se observar demais um sanduiche comprado num bar sujo, a visão mais clara que conquistei me causa náuseas. Estou cercado por tudo o que me pertence, mas não pertenço, não vivo do mesmo combustível e meus movimentos são calculados na base de outro sistema métrico. Entrei num jogo muito mais complexo do que gostaria, mas a partir do momento em que compreendi as regras, percebi que eu era o único que o havia feito - o que me deixa em uma posição delicada, porém privilegiada. Assim me torno franco-atirado, me torno ex-futura vitima com uma arma destravada no bolso e olhar desavisado. Me torno mentiroso, me torno canalha filho da puta cretino de merda, me torno tão verdadeiro que sinto medo, sinto como se tivesse acordado novo e completamente honesto.
Mas as náuseas continuam...
E todo remédio eventualmente sai do sangue ou vira toxina sob os olhos do corpo, que parece querer o mérito de se curar sozinho. Admiro tamanha coragem, tento condicionar minha mente ao mesmo comportamento. Mas por enquanto a dose só aumentou, e o efeito diminuiu. Hora de abrir a velha garrafa de Whisky. Talvez, em seus 18 anos de amadurecimento ela tenha alcançado um nível maior de conformismo com o mundo do que eu. Ou pelo menos um sabor que valha o seu preço.
Que seja, só me sirva uma dose e fique por perto enquanto eu cambaleio por entre gentilezas falsas e amores forçados, laços que parecem terem sido soldados ao quarto que, ao mesmo tempo que me prende, serve de fortaleza impenetrável. E lá fora é tão áspero que nem o cheiro dos milhares de baseados consegue sair.
Continuo trancado num quarto de janelas abertas, ironizando a própria ironia e sortido de um medo que é tão meu quanto o ar que me cerca. E com base na propriedade indefinida de tudo, me permito uma chama de esperança quase infantil. Uma chama que, cercada de ar viciado, curiosamente tende a se inclinar para a janela. Interpreto-a como um farol na escuridão do mar, e levo meu corpo cansado de marinheiro perdido para perto dela, luz quente que me cega, cessando o sentimento de nojo e me acolhendo mais do que meu lar. Ah, alivio! Procuro-te, desejo-te, acredito em tua existência, pois nesse e em outros momentos, é tudo o que me resta.



Feliz ano novo!